[SHOW] Você se lembra?

Show do Jack Johnson, em Perth, Austrália, dia 7/12/2013

Meu presente de Natal chegou um pouco antecipado esse ano. Fui ao show de uma das pessoas que mais admiro no mundo: Jack Johnson. O surfista passou por Perth na sua turnê de promoção do disco "From Here to Now to You". Sua passagem na capital da Costa Oeste foi no último sábado e o local escolhido foi nada menos que o King's Park que é um dos locais mais bonitos da cidade. Tinha tudo para ser incrível. E foi ainda mais que isso! Descrevo tudo na sequência enquanto você ouve a canção com a qual ele abriu o show, presente no disco "In Between Dreams", de 2005. Segue a letra:




Do You Remember
(Johnson)

Do you remember when we first met? I sure do
It was some time in early september
You were lazy about it, you made me wait around
I was so crazy about ya, I didn't mind
So I was late for class, I locked my bike to yours
It wasn't hard to find you painted flowers on
Guess that I was afraid that if you rode away
You might not roll back my direction real soon

Well, I was crazy about you then
And now but the craziest thing of all is
Over ten years have gone by and you're still mine
We're locked in time, let's rewind

Do you remember when we first moved in together?
The piano took up the living room
You'd play me boogie-woogie, I played you love songs
You'd say we'll playing house
Now you still say we are
We build our getaway up in a tree we found
We felt so far away though we were still in town

Now I remember watching that old tree burn down
I took a picture that I don't like to look at

But all these times they come and go
And alone don't seem so long
Over ten years have gone by
We can't rewind, we're locked in time
But you're still mine

Do you remember?

Dê o play e comece a viagem:



Vamos à andança...

Quando escrevi sobre o épico show do Paul McCartney em São Paulo achei que seria mais eficiente em minha resenha se eu contextualizasse a importância daquele evento para esse beatlemaníaco que escreve. Creio que essa prática será importante agora também, dada à influência que Jack Johnson tem na minha vida. Sim, já fui num show dele, em 2011 e foi uma experiência sensacional, mas eu ainda não tinha claro para mim o quanto era fã desse músico havaiano. Hoje, com a mente aberta pela mudança para a Austrália, me aproximei ainda mais do cantor e sei com clareza qual sua posição na minha mente: ele é meu músico em atividade preferido. E só digo "em atividade" para que exclua-se Beatles, mas atrás apenas do quarteto, creio que Jack Johnson é quem eu mais admiro no universo da música. Não só pela música, mas também por seu engajamento para ajudar a melhorar o mundo. Ele é o tipo de pessoa que faz bom uso de seu dom: usa-o para contribuir com o próximo, seja por meio de ações sociais, seja por sua música cheia de paz e amor. Por causa dele comecei a tocar violão. Quando cheguei na Austrália, meus primeiros dólares foram gastos em uma viola usada para que eu pudesse praticar as poucas canções que sei - muitas das quais são dele. Por muitos dias essa velha Yamaha foi minha principal companhia aqui. Não sou um músico profissional e nem almejo ser. Tenho apenas a pretensão de tocar algumas boas músicas com meus amigos numa tarde qualquer - talvez na praia - ou curtir um bom momento sozinho. Por muito tempo a vontade de tocar violão me seduziu, mas eu sempre a rejeitei sob a desculpa de que já estava velho demais para aprender. Embora isso seja verdade, o violão só me trouxe paz e alegria e por isso tenho muito à agradecer à Jack e sua trupe pela inspiração e meu grande amigo e mestre Silvério pelas aulas. Foi com Gone que a decisão final de aprender foi tomada e essa foi a primeira música que aprendi. Não preciso dizer o quanto foi surpreendente e emocionante ver Johnson tocando-a, sozinho, no palco. Outras canções magníficas que o músico apresentou sozinho numa performance acústica impecável foram Do You Remember, além de uma versão diferente e interessante de Good People. Com simplicidade e tranquilidade Jack condiziu o show de forma excepcional, nunca deixando o ânimo do público esfriar - nem mesmo dos que estavam aconchegantemente deitados no gramado do parque. Para os fãs que estavam na pista, o concerto foi um presente embalado com carinho e aberto lentamente, como quem desfruta tirar pedaço por pedaço do papel de embrulho. Cada momento se tornou único com a execução de obras já consragadas como Sitting Waiting Wishing, Home e Flake, além de canções do seu último e excelente disco como a cativante Radiate, a poderosa Washing Dishes, além de Shot Reverse Shot e Tape Deck. Uma das características mais marcantes dos concertos de Jack e sua banda são as mudanças nas próprias canções, ora com ritmos subitamente alterados, ora com covers mais que especiais. Em sua primeira passagem pelo Brasil, o cantor incluiu Just What I Needed do The Cars no meio de Sitting Waiting Wishing e aqui a história se repetiu, para deleite dos fãs. Se no disco "En Concert" uma das faixas mais aplaudidas é a emenda entre Do You Remember e Remember de Jimi Hendrix, aqui Johnson fez outra homenagem ao mestre da guitarra. Enquanto tocava a empolgante At or With Me era possível observar uma presença maior na bateria de Adam Topol. Logo percebemos o motivo: a banda emendou com maestria a ótima canção Crosstown Traffic de Hendrix e o público pode delirar emulando os backing vocals lendários de de Mitch Mitchell e Noel Redding. Não apenas o baterista de Johnson demonstrou grande competência, mas também Merlo Podlewski com seu baixo sempre tranquilo e sua presença já congrada nos vocais de Staple it Together com um rap excelente. Apesar do grande nível da banda como um todo, é de se destacar o talento de Zach Gil, exímio pianista que também empresta o carisma e as habilidades com uma escaleta, acordeon e vibrafone em diversos números. Jack também alternou de violão para a guitarra para canções mais rápidas e ao final de Radiate criou, junto com os colegas, uma improvisação surreal e absurdamente viajante - toda efeitos sonoros e luzes. Apesar da altíssima perícia, Johnson está e estará sempre ligado mais ao violão do que a guitarra. É por isso que não puderam ficar de fora obras incríveis que no dedilhado do surfista se tornam verdadeiros poemas sonoros. É impressionante ver como é tão natural para o músico tocar cada acorde e solar nas cordas do violão. Foi o caso em Banana Pancakes, o maravilhoso encerramento em Better Togheter, a inebriante Tomorrow Morning e a contagiante Bubble Toes. Para quem apreciou o disco "Kokua Festival" cheio de convidados especiais, o show ainda trouxe parte do conceito consigo. Paula Fuga e John Cruz, dois músicos conterrâneos da banda emprestaram suas belíssimas vozes para canções emocionantes como Island Style e Country Road.


Se por tudo isso pode-se concluir que a experiência de um jovem sonhador como eu foi boa, quando adiciono alguns fatores inexplicáveis do destino à trama, essa mesma experiência pode soar indescritivelmente formidável. Acontece que fui ao show com minha pequena e melhor amiga. Como muitos dos casais do mundo, nossas experiências são banhadas e muito ao som do havaiano. Por um misto de sorte e oportunidade conseguimos ficar no melhor lugar possível: na primeira fila da platéia exatamente na frente do cantor. Melhor impossível. Quando ele abriu o espetáculo com a sequência de notas iniciais de Do You Remember não pude acreditar. Não só eu estava na Austrália, assintindo um show do músico que mais admiro; não só eu estava com minha namorada no melhor lugar do show; ele ainda abriu o concerto com a primeira música que nos conectou. Foi com Do You Remember que nossa história começou e, exatamente por isso, o dia foi realmente fora de série. Impossível não fazer uma associação com a canção, já que Jack descreve as memórias e o começo de sua história com sua namorada ao longo de dez anos - ou melhor dizendo, vinte, como ele mesmo corrige nas últimas execuções. Essa canção faz pensar em como o tempo passa rápido e deixa memórias - ora simples detalhes, ora momentos inesquecíveis - tão especiais, responsáveis pela construção de toda uma vida. É a pequena casa na árvore, o piano que ocupa a sala toda, a bicicleta com flores pintadas. Tudo isso é uma pequena coleção de memórias que duraram 10 anos entre eles e tornou suas vidas juntos uma experiência absolutamente única. Ao final Johnson diz: "Todos esses momentos vêm e vão e separados não parecem tão longos, mas dez anos se passaram. Não podemos voltar, estamos presos no tempo. Mas você ainda é minha". E como a vida é uma rede complexa de vidas interligadas, acredito que o próprio show do Jack Johnson aqui na Austrália será uma dessas lembranças que guardarei e lembrarei com carinho, mesmo depois de dez ou vinte anos. Vou olhar pra trás, sorrir e perguntar: você se lembra?

Comentários

Unknown disse…
Ah! Muito bom!
Tô ouvindo aqui também!
Felipe Andarilho disse…
Show, que bom que curtiu! Já conhecia essa?? E se ele for pro Brasil, nao perca pelo amor de Deus!