Vou seguir meu caminho

Muitas pessoas, muitas histórias e um único caminho

Para um amante do Rock não há limites. Quanto mais você cava, maiores são os tesouros que descobre. Se tiver alguns amigos cavando com você a probabilidade de acharem relíquias incríveis é ainda maior. Quem quiser cavar no parque dos Beatles, as surpresas vão demorar pra terminar, se é que vão terminar. Eu levei quase 10 anos pra conhecer boa parte da discografia dos caras, mas reconheço que podem haver coisas deles que eu ainda não ouvi. Um exemplo dessas delícias raras é a canção da qual vou falar hoje, lançada apenas na Inglaterra em 1963, mas que depois ficou disponível numa compilação de aparições do quarteto na Rádio BBC, lançada em 1994 e entitulada singelamente como "Live at BBC". Segue a letra:




I'll Be on My Way
(Lennon/McCartney)

The sun is fading away
That's the end of the day
As the June light turns to moonlight
I'll be on my way

Just one kiss and I'll go
Don't hide the tears that don't show
As the June light turns to moonlight
I'll be on my way

To where the winds don't blow
And golden rivers flow
This way will I go

They were right, I was wrong
True love didn't last long
As the June light turns to moonlight
I'll be on my way, hey

To where the winds don't blow
And golden rivers flow
This way will I go

They were right, I was wrong
True love didn't last long
As the June light turns to moonlight
I'll be on my way, hey

I'll be on my way, oh, oh
I'll be on my way, oh, oh
I'll be on my way

Vamos à andança...


Lembro como se fosse ontem do dia em que comprei o disco "Live at BBC". Em uma das minhas primeiras e raras visitas à Galeria do Rock foi onde o vi pela primeira vez. O preço era salgado. 60 pratas por um CD duplo usado. Praticamente as economias de um ano pra um adolescente que ainda nem sonhava em trabalhar. Seria preciso esperar uns dois aniversários e um Natal pra juntar toda aquela fortuna. Os dias passaram até que finalmente juntei o montante e a coragem pra adquirir a preciosa relíquia. Eu ainda não tinha todos os discos dos Beatles, mas de alguma forma aquela foto em sépia do quarteto caminhando na frente da rádio (foto acima) registrou o disco na minha mente emitindo um alerta, pedindo para ser resgatado daquela loja empoeirada onde ele não fazia o que tinha vindo ao mundo pra fazer: ser tocado e, consequentemente, fazer as pessoas viajarem. A espera e o suspense valeram a pena. Quando peguei o metrô de volta com meu amigo Felipaines, ambos estavamos maravilhados com a lista de mais de 30 faixas em cada disco, a maioria das quais nunca tínhamos ouvido falar - e olha que nessa história estão dois dos maiores beatlemaníacos que já caminharam sobre a Terra. Fiz as contas rapidamente. Cada faixa foi menos de 1 real - ótima aquisição. Quando paramos numa padaria pra tomar um bom suco de laranja, Felipaines descobriu o segredo da peça: boa parte das canções vinham com a legenda "Speech", ou seja, não eram músicas, mas sim conversas, piadas e trechos de entrevistas do grupo na rádio. Tanto melhor. Ainda dou risada ao ouvir John Lennon pedindo pro locutor imitar o Mickey Mouse em uma das pistas. A parte musical, entretanto, trazia canções que iam do primeiro disco até mais ou menos "Help!" de 1965. Além disso, metade do disco é composto de covers que vão de Chuck Berry à Buddy Holly, passando por nomes ainda mais lendários como o próprio rei Elvis Presley. E, para orgasmo de beatlemaníacos, o disco ainda traz obras jamais lançadas em outro álbum ou compilação, uma delas composta pelos próprios Beatles: I'll Be On My Way. Essa coisa linda em forma de música traz o que há de mais puro na obra do quarteto de Liverpool na embalagem de uma poesia singela e uma instrumentação bela. Começa com uma guitarrinha delicada de Geroge Harrison fazendo um riff elétrico gostoso que logo passa a ser acompanhado pelo gingado ótimo de Ringo Starr. Com o corpo formado, Lennon canta a primeira voz, mas é acompanhado de ponta à ponta pelos ótimos backing vocals de Harrison e Paul McCartney, compositor da peça. John canta uma letra tocante sobre a despedida triste, porém resignada de um personagem que amou e deixou alguém. Começa assim: "O sol está de pondo, é o final do dia. Assim como a luz de junho se torna a luz da lua, eu vou seguir meu caminho". Apesar de decidido, ele sabe que vai ter que deixar pra trás parte de seu coração: "Só mais um beijo e eu irei. Não esconda as lágrimas, assim como a luz de junho se torna a luz da lua, eu seguirei meu caminho". Agora com uma pequena variação no tempo, Lennon puxa a ponte: "Para onde o vento não sopra e rios dourados correm. Por esse caminho eu irei!" Nessas palavras finais fica a despedida definitiva, mas logo a música volta pra instrumentação tranquila, onde o narrador abre um pouco mais do jogo e dos motivos de sua partida: "Eles estavam certos, eu estava errado. O amor verdadeiro não dura muito". E assim o personagem criado por McCartney canta mais uma vez seu refrão e segue seu caminho com sua música. Ela é então ensaiada e gravada, mas estrategicamente pensada para não sair em nenhum disco até 30 anos depois. É lançada e exportada para outros países. É comprada e vendida novamente para uma loja no centro da cidade. E lá ela é finalmente comprada novamente por um garoto que nem era nascido quando ela foi inicialmente concebida como uma fagulha de arte e inspiração na mente do baixista do grupo. Como I'll Be on My Way nossos caminhos são assim, misteriosos e fascinantes ;)

Nunca ouviu?

Seu caminho te trouxe até essa canção. Escute:

Comentários

Fabio CS disse…
Sempre se descobrem coisas novas na bibliografia e discografia dos Beatles..foi incrível a passagem deles na música do mundo e até hoje se descobrem pérolas...
Felipe Andarilho disse…
Sim, essa é uma das pérolas escondidas! Obrigado pela visita!